E a Alemanha com isso?

 

As tratações com a Alemanha para devolução da relíquia foram um paciente trabalho de persuasão, embora em princípio houvesse o acordo das autoridades-guardiãs de Kuêk. O Diretor do Museu de Anatomia da Universidade Frederico-Guilherme da Renânia-Palatinado-Bonn, Prof. Karl Schilling, desde o começo esteve do nosso lado. Grupos religiosos obstavam a devolução: seu principal argumento seria que Kuêk fora batizado como cristão no Brasil e que na Alemanha fora enterrado como católico, o que não dava mais direito a sua tribo de recebê-lo de volta (resta ver em que condições Kuêk recebera o batismo). 

 

Outros grupos,  "científicos", de que o seu crânio faria parte do acervo museológico do país e ali devia permanecer. Transcrevemos aqui um e-mail recente do Prof. Schilling, que poderá nos dar uma idéia do que estão sendo essas discussões na Alemanha. Uma coisa é clara: Jequitinhonha pediu, a Alemanha consentiu. Bravo, Jequi! Com a palavra, o Prof. Schilling:

 

Cara Sra. Pereira


    Muito, muito obrigada (pelas informações). Eu queria juntar algumas informações, uma vez que estou dentro da história, e preparando alguns pontos para discussão no debate (do Encontro Indígena
 e um deles poderia ser descrito assim: “Como fiquei conhecendo Kuêk”.

 

    Como eu já lhe contei, há muitas pessoas que prefeririam reter a relíquia de Kuêk aqui na Alemanha. Esse grupo tomou, há algum tempo, o crânio de Kuêk emprestado para um Congresso de cientistas

amadores. Esse Congresso foi, pode-se dizer, uma nulidade em termos de Ciências e História.

 

    Entretanto, o nome de Kuêk e sua história (cujos detalhes infelizmente nunca são bem contados) a partir daí apareceram sempre na Media, e também na Wikipedia. Eu sempre me coloquei esta questão: se esse Congresso de amadores não teria no final das contas tido um bom resultado: o de dar publicidade a essa relíquia, e que através disso ela finalmente tenha podido ser entregue a quem de direito...

 

    Estou  encantado de poder fazer essa viagem, e especialmente de poder conhecer as pessoas daí.
Com os melhores cumprimentos

    Karl Schilling


    PS: Acabei de receber um livrinho de Luís da Câmara Cascudo sobre Max de Wied, escrito em 1977 – e que eu me dedico mais a olhar do que a ler. Mas no fim da obra encontrei uma frase que pude entender: “Seu crânio está no Museu de Anatomia de Bonn”. Voilà, a coisa já há tempos bem conhecida!
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Karl Schilling, MD
Professor of Anatomy and Cell Biology
Anatomisches Institut
Rheinische Friedrich-Wilhelms-Universität